segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Dia do Deficiente Físico.

São muitas as dificuldades encontradas pelos portadores de deficiência nos gestos e movimentos mais simples do dia-a-dia. Nas dificuldades para andar pelas ruas, tomar uma condução, entrar em lojas e bancos; uma infinidade de situações que é até difícil de imaginar. Por isso, sempre que puder, cobre das autoridades o cumprimento e a criação de cidades mais humanas e espaços preparados para receber bem o deficiente físico. O cidadão deficiente também quer seus direitos cumpridos e respeitados.



Apenas um em cada 20 portadores de deficiência física ou mental estuda em escola especial. O restante, segundo o Censo Escolar de 1999, freqüenta instituições para deficientes ou estuda em escolas regulares. O número de estudantes deficientes com mais de 19 anos é de 6 milhões. Nos últimos dois anos, as matrículas em escolas especiais cresceram 6%, passando de 293 mil para 310 mil. Cerca de 55% desses alunos são atendidos por escolas privadas e quase 70% deles estão nas regiões Sul e Sudeste. A lei delega aos estados e municípios a responsabilidade pelo atendimento desses alunos, que devem, preferencialmente, ser matriculados em escolas regulares.



Entre muitos problemas não resolvidos em nosso país, está a situação das pessoas portadoras de deficiência física, cuja noção está ligada ao problema geral da exclusão. Vítimas de problemas congênitos, enfermidades ou causas traumatológicas, perfazem 10% de todo o seu contingente.



Como toda minoria, são relegadas a segundo plano, tendo em vista não existir uma consciência popular valorativa sobre os seus potenciais, como se a cabeça estivesse na disfunção de um membro locomotor ou no atrofiamento de um braço.



Ter um defeito físico, andar numa cadeira de rodas, geralmente significa ser inválido, estar cerceado do sagrado direito de sustentar-se com o fruto do próprio trabalho. É a chamada rotulagem despreziva que tanto mal nos faz. Os órgãos estatais fecham as portas. E, para qualificar-se, nem se fala, pois as barreiras arquitetônicas das escolas relegam o aluno, logo no primeiro dia de aula, bem como o mobiliário das cidades e o transporte coletivo, que não são planejados para esses "imperfeitos seres".



A discriminação, por parte da própria família, que tem por tradição esconder os seus deficientes, é a mais crucial, numa amostra, sem dúvida, de desumanidade. É o retrato de um País que não encara os seus problemas, não sabe transformá-los, aceitando, apenas, os fortes, perfeitos e vencedores.



A sociedade não sabe conviver com essas pessoas. Ainda não conseguiu entender que o maior potencial humano é a mente e, se essa está ilesa, a vida é possível e o trabalho é digno dentro da capacitação. A informação e o espírito de solidariedade ainda são muito pequenos entre nós. Nunca paramos para pensar como é o dia-a-dia de uma pessoa que tem por pernas quatro rodas de uma cadeira. Estamos sempre ocupados com os nossos próprios problemas, esquecendo-nos de que as fatalidades não avisam, nem escolhem status. Quando deparamos com alguém de muletas ou cadeira de rodas, a idéia é de que está aposentado ou aposentando, embora sirvam as pernas, apenas, para cumprir a simples missão de andar. Se a pessoa for do sexo feminino, principalmente, presume-se logo que jamais encontrará companheiro, ou, se a seqüela for recente, fatalmente será abandonada por ele. É como se, de repente, o ser humano se transformasse num objeto sem valor.



É raro vermos uma pessoa deficiente física ocupando um cargo público de comando. Se a fatalidade ocorre durante o exercício do dele, a aposentadoria é compulsória, sem nenhuma chance de readaptação dentro do órgão. Sequer pensa-se numa transferência para outro cargo mais compatível com a limitação física adquirida. Simplesmente, descarta-se. Afinal, estamos na era dos descartáveis. É um marco da personalidade brasileira e do machismo arraigado de governantes desinformados que não sabem buscar, transformar, aproveitar, mesmo tanto tempo depois da teoria de Lavoisier: "...nada se perde, tudo se transforma". Quando uma parte do corpo se fragiliza, as outras se encarregam do trabalho, provando que não há problema sem solução.



A mídia é a grande responsável por essa imagem, tão negativa, do deficiente físico. Fulcrada em desinformações, as novelas banem até a sua sexualidade, forçando-o, mesmo, a tornar-se um cadáver vivo. Estar deficiente, fisicamente, não significa estar assexuado. Sempre há uma saída, tendo em vista a lei da compensação e a perfeição da natureza.



É costume, também, mostrar a penúria, a fatalidade, a invalidez do incapacitado físico, e nunca o seu trabalho digno, a sua competência, o seu esforço para vencer barreiras. Vê-se sempre o invólucro, e nunca o conteúdo. É pena que não entendam que do mínimo indispensável é possível construir uma obra de arte. "O essencial é mesmo invisível aos olhos. É preciso buscar com o coração".



Apesar de não sermos detentores dos nossos movimentos físicos, não precisamos da caridade pública e não devemos ser excluídos do sistema socioeconômico e político do País. Precisamos ser reconhecidos como força de trabalho, com o direito de competirmos e mostrar que somos capazes, quebrando tabus, preconceitos e discriminações.



"...tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que eles se desigualam". Sabedoria máxima de Rui Barbosa, que bem pode ser aplicada aos incapacitados físicos. Afinal, somos desigualdades, mas merecemos respeito e temos o direito de legar a nossa participação de trabalho.



A Constituição Federal de 1988, que aprovou as mais amplas garantias públicas da história, resguardou-nos direitos de cidadania como participantes da vida, da seguinte forma:

_ Art. 7º, XXXI - proibiu quaisquer discriminações no tocante a salários e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência física.

_ Art. 23, II - determina competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência. (O Decreto 914, de 6.9.93, instituiu a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência).

_ Art. 24, XIV - falou da proteção e integração social; (Lei 7.853/89 dispõe sobre apoio ao deficiente, institui a tutela jurisdicional, cria a CORDE, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes e dá outras providências).

_ Art. 37, VIII - falou sobre os cargos e empregos públicos. Reconheceu e abriu mercado de trabalho aos deficientes, e, por meio da lei 8.112/90, determinou que a União reservasse, para os deficientes, até 20% das vagas dos concursos públicos. Contudo, para poucas vagas, somos preteridos, uma vez que os órgãos estatais, em suas leis regulamentares, não nos têm destinado mais do que 3 ou 4% dessas vagas. Sem se falar de Estados e Municípios que até hoje não procederam as suas leis regulamentares.

_ Art. 93, da Lei 8.213/91 - destina 2 a 5% das vagas em empresas, com mais de 100 empregados, a deficientes. À medida que a sociedade provê meios para que o deficiente possa atuar produtivamente no sistema capitalista em que vivemos, estará realizando um investimento social, uma vez que o deficiente deixará de ser um consumidor de políticas de previdência e assistência social, para capacitar-se como produtor de receitas públicas, mediante o recolhimento de impostos sobre sua atividade profissional.

_ Art. 203, IV - garantiu a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária.

_ Art. 203, V (e Lei 8.742/93, art. 2º, V, de 7.12.93 - Lei Orgânica da Assistência Social) - garantiu um salário mínimo mensal aos deficientes carentes que não possam manter-se, inclusive o idoso.

_ Art. 227, § 2º e art. 244 - defenderam o acesso adequado a logradouros e edifícios públicos, fabricação de veículos de transporte coletivo e adaptação dos já existentes. Medida muito importante, pois precisamos conviver com as pessoas, executar o nosso caminhar pelas ruas da cidade, mostrar que existimos. Assim, estaremos participando e ostensivamente reivindicando o nosso espaço, pois, primeiro o fato social, depois as normas. Sabe-se que as casas de diversões públicas, com capacidade para mais de 100 pessoas, deverão ter acesso e banheiros adaptados para deficientes, bem como restaurantes e hotéis. Pena, que os já existentes - pseudos banheiros adaptados - nada têm a ver conosco. São somente fachadas. Embora exibam grande adesivo do deficiente físico, apenas iludem os andantes e servem aos muletantes. É como se, de repente, a gente num passo de mágica pudesse ficar de pé, empurrar a cadeira para fora, fechar a porta e sentar-se no vaso, dada a exigüidade de espaço e a falta de conhecimento sobre o dia-a-dia de um cadeirante, além do desrespeito ao seu pudor. Não há consciência popular. Nesses empreendimentos não há consulta prévia aos seus reais usuários. É como se fosse a feitura de obras eleitoreiras. Lamentável! Precisamos mudar esse estado de coisas!

A acessibilidade é o pré-requisito básico para que o deficiente viva com dignidade, emprestando ao País sua cota participação de trabalho, como cidadão que é.

Precisamos continuar lutando pelo reconhecimento da igualdade jurídica e pelo direito ao trabalho, máxima maior estampada na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Muitas vezes, para o deficiente, o trabalho pode ter fins terapêuticos, melhorando sensivelmente sua saúde física e mental, aumentando-lhe o prazer de viver, respeitando assim a sua dignidade de pessoa humana, como um dos fundamentos da nossa Carta Magna.

_ Lei 8.899/94 - concedeu passe livre interestadual ao deficiente carente que, por motivo justificável, necessite deslocar-se para outro Estado. Ao deficiente físico é, também, facultado adquirir veículo, adaptado às suas condições físicas, com isenção de IPI (Lei 8.989/95), conseqüentemente ICMS e IPVA. Partindo do princípio de que o veículo, além de instrumento de trabalho é o substituto de nossas pernas, torna-se de muita importância essa isenção fiscal, pois nos permite a celeridade do caminhar, inserindo-nos com mais facilidade no mercado de trabalho e na convivência social.



Entretanto, sabemos que nem todos os artigos são auto-aplicáveis, necessitando de leis regulamentadoras (federais, estaduais e municipais), que morosamente arrastam-se pela burocracia. Mas, já é um avanço que tem melhorado a qualidade de vida do deficiente físico, aumentando-lhe a auto-estima e proporcionando-lhe o sustento com o próprio trabalho. Ouso dizer que não se deve dar ao homem o que ele pode conseguir com fruto do seu trabalho, sob pena de roubar-lhe a dignidade. O trabalho é uma verdadeira terapia ocupacional, que nos devolve o sentimento de utilidade. É a oportunidade merecida para provarmos que poderemos ser, não apenas força produtiva, mas, força transformadora, aumentando a esperança num País justo e progressista, diminuindo-lhe os problemas sociais, além de servirmos de motivação e incentivo aos muitos paralíticos andantes, que se estribam numa ociosidade crônica para nada fazerem ou mal fazerem. Com a abertura do mercado de trabalho, através da Carta Magna, chegou a hora de provar a que viemos. Chegou a hora de mostrarmos à sociedade que o mais perfeito caminhar executa-se com mente, além do famoso "querer é poder". Chegou a hora de darmos exemplo.

É bom que nos engajemos em associações classistas para conseguirmos prática de vida, mercado de trabalho e qualificação para tal. É lá que encontramos pessoas iguais, com as mesmas amarras físicas, mas com grande desejo de conquista, pois poderemos ser vítimas do destino, não da indiferença.



Não obstante os muitos cerceamentos que sofremos na pele, impostos pela deficiência, temos que rebatê-los com uma só ação: CORAGEM! Coragem de ir à luta e vencer, deixando sempre à amostra a competência, o preparo técnico-científico peculiar ao desempenho da função que conquistarmos, nunca nos escudando sob o pretexto da deficiência para auferirmos vantagens ou buscar protecionismo. Não há discriminação que resista à competência.



Agora, resta-nos exigir o cumprimento das leis na satisfação dos direitos. Necessário se faz um trabalho conscientizador a partir do próprio deficiente, da sua família (que deve se engajar) até à sociedade e governantes, tão desinformados sobre os potenciais humanos. É preciso que a sociedade troque os sentimentos de paternalismo, compaixão ou desprezo por outros valorativos, respeitosos e reconhecedores, devolvendo ao deficiente físico a cidadania, o direito de participar dessa caminhada que chamamos de VIDA.

Fontes: Almanaque Abril, UERJ Clipping e Ministério Público Federal.

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