segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Estatuto da Pessoa com Deficiência gera polêmica na Câmara Federal



A proposta que cria o Estatuto da Pessoa com Deficiência (PL 3638/00) prossegue sem acordo na Câmara. Após quase dez anos de tramitação, parlamentares e entidades reconhecem a importância da proposta, mas reivindicam alterações no texto.



Para a representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência (Conade - órgão da Secretaria Especial de Direitos Humanos que reúne integrantes do governo e de organizações da sociedade civil), Laís de Figueiredo Lopes, o debate gira em torno da abordagem da proposta. "O projeto, segundo alguns movimento sociais, trouxe uma visão assistencialista do grupo, o que gera resistência entre aqueles que trabalham no sentido do protagonismo das pessoas com deficiência, que não devem ser vistas simplesmente como beneficiários de certas políticas públicas."



A proposta de estatuto reúne leis e decretos que concedem benefícios ao grupo, além de propor algumas novidades, como: prioridade na tramitação de processos judiciais; programas específicos de educação profissionalizante; tipificação de crimes contra pessoas com deficiência; ampliação do perfil para recebimento do benefício de prestação continuada (BPCBenefício no valor de um salário mínimo e pago mensalmente a pessoas idosas de 65 anos ou mais e portadores de deficiência incapacitados para a vida independente e para o trabalho. Em ambos os casos, os beneficiados devem pertencer a famílias com renda por pessoa inferior a 1/4 do salário mínimo. ), entre outras.



Convenção da ONU

O principal argumento contra a votação do Estatuto da Pessoa com Deficiência é uma suposta dessintonia entre o texto que tramita na Câmara e o tratado internacional resultante da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, realizada pelas Nações Unidas em Nova Iorque, em 2006. Mais de 140 países são signatários do tratado, incluindo o Brasil.



O deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG), que é presidente da Federação Nacional das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Fenapaes), explica que o projeto de lei não foi debatido após a ratificação do tratado pelo País, que ocorreu em 2008. "Existem alguns temas ligados principalmente à tutela das pessoas com deficiência, à emancipação civil desse grupo e aos seus direitos políticos que precisam de maiores reflexões", argumenta.



O presidente da Associação Nacional dos Cegos do Brasil (ONCB), Moisés Bauer, explica que "o tratado internacional traz uma abordagem diferente daquela proposta no projeto do estatuto, tendo por base uma visão de autossuficiência da pessoa com deficiência".



Laís de Figueiredo Lopes explica que, em 2009, o Conade e a Subsecretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência promoveram uma série de encontros regionais para debater a proposta. Mas, segundo ela, ainda são necessários mais debates sobre o tema. Laís explica que a "falta de consenso" atinge pontos que variam desde a capacidade legal das pessoas com deficiência, a inserção desse público nas escolas comuns até o próprio conceito de deficiência. Para ela, "a deliberação não avança no Legislativo porque, de certa forma, o Congresso tem sido respeitoso com os movimentos sociais".

Fonte: http://www.correiodoestado.com.br/



Veja abaixo o Manifesto Contra o Estatuto da Pessoa com Deficiência retirado do site CVI (Centro de Vida Independente).



No projeto de lei que prevê a criação do Estatuto da Pessoa com Deficiência estão inseridos programas, serviços, atividades e benefícios, muitos deles ainda concebidos através de uma visão assistencialista e paternalista e por vezes até autoritária em relação às pessoas com deficiência.



Isto porque muitos ainda nos veem como objeto de caridade, como incapazes e sem direito de fazer nossas próprias escolhas, tomar decisões e assumir o controle de nossas vidas.



Este projeto de lei, resultado de consultas públicas ao longo de alguns anos, como dizem seus defensores, altera a legislação vigente nos eixos da educação, saúde, trabalho, transportes e outros, enfim, altera as leis que hoje cunham as políticas públicas em todas as esferas de governo: federal, estadual, municipal e distrital.



Sabemos que vários interesses conflitantes permeiam cada um dos temas tratados no Estatuto. São interesses políticos, econômicos e corporativos que não representam as atuais conquistas do movimento das pessoas com deficiência.



Dizer que o Estatuto é inevitável e por isso temos que colaborar para que o seu texto seja menos ruim, é negar anos de luta do Movimento das Pessoas com Deficiência que desde 1981 - Ano Internacional das Pessoas Deficientes - começou a exigir "participação plena e igualdade de oportunidades". De lá para cá muitas ações reforçaram esta exigência. Nosso Movimento foi autor de alguns artigos da Constituição Federal de 1988 e conseguiu aprovar e barrar inúmeras leis.



O Estatuto é uma volta ao passado, quando os instrumentos legais e recomendações internacionais eram direcionados ao assistencialismo às pessoas com deficiência.



Nos tempos atuais um estatuto específico para nós é um contra-senso e um retrocesso, se coloca na contramão da evolução histórica, prejudicial ao reforçar a imagem de inválido e "coitadinho", levando a sociedade a continuar tratando a pessoa com deficiência como um ser desprovido de capacidade. Desta forma, o Estatuto legitima a incapacidade e oficializa a discriminação contra a pessoa com deficiência ao separá-la das leis comuns.



O Estatuto é desnecessário, pois a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, maior conquista da história mundial dos direitos humanos, já faz parte do nosso arcabouço legal, ratificada através do Decreto Legislativo 186/2008, com status de emenda constitucional, e reafirmada pelo Decreto 6946/2009.



Basta agora ajustar nossa legislação à ela. Já existe um estudo, encomendado pela CORDE e patrocinado pela UNESCO, que faz um paralelo entre a Convenção e a Legislação existente e aponta as alterações necessárias.



Nossa luta urgente é pela criminalização da conduta discriminatória contra as pessoas com deficiência.



Estamos caminhando para que a sociedade perceba que a pessoa com deficiência faz parte da população e é titular de todos os direitos, obrigações e liberdades fundamentais. Deverá ficar claro que, nas leis comuns, a pessoa com deficiência está incluída com o mesmo direito aos serviços oferecidos à população e que serão previstas especificidades de usufruto somente quando as condições de uma determinada deficiência assim exigir.



Em tal contexto, não haverá lugar para um Estatuto separado sobre as pessoas com deficiência. Todas as eventuais vantagens de um instrumento como este não compensam a anulação do processo de amadurecimento, evolução e conquistas do movimento das pessoas com deficiência nos últimos 30 anos, no Brasil.

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